22 Agosto, 2017
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1 Julho, 2007 Ricardo Vargas

É a Qualidade, Estúpido!

In Executive Digest


Não se abre um jornal, não se lê um estudo, não se ouve um comentador, não se vê uma entrevista em que o senhor do momento, quando questionado sobre a complexa problemática nacional, não vaticine: “o mal nacional é a baixa produtividade.”

A baixa produtividade impera no bestiário dos nossos monstros. É à produtividade que devemos vassalagem, a ela subjugando salários, nível de vida, aspirações, decisões, investimentos. Não arriscamos sequer sonhar mais alto com medo que a baixa produtividade nos acorde para uma realidade deficitária.

Entende-se esta obsessão. Primeiro, porque a produtividade se traduz num número e as pessoas sérias gostam de argumentar com números; fá-las parecer informadas. Depois, porque é uma forma de evitar pensar mais e melhor no assunto. Pois se a produtividade é assim de fraquinha, que fazer senão lamentar ou pedir ao governo que mude as coisas, cruzando os braços entretanto?

Esta visão enferma de dioptrias suficientes para envergonhar um microscópio. Porque a baixa produtividade não é o mal nacional, é uma consequência do mal nacional. Mas para entender isso é preciso conhecer o António.

O António perde tempo a conversar com os colegas em vez de produzir, e depois queixa-se que tem de trabalhar mais tempo ao fim do dia.

O trabalho do António depende do trabalho de outras pessoas da empresa, numa sequência lógica de tarefas. Como os processos estão mal definidos, todos têm períodos de espera sem produção.

Porque não tem competência adequada, o António comete muitos erros que o obrigam a retrabalhar o que já tinha sido feito, gastando o dobro do tempo necessário.

O António presta serviço a clientes, mas quando eles têm problemas obriga-os a passar por uma tortura burocrática, com falta de informação clara e indecisão, obrigando toda a gente a perder meio-dia em vez de quinze minutos.

O António não usa eficientemente os recursos da empresa, desperdiçando-os ou usando-os em proveito próprio.

O António delega tarefas nos seus colaboradores sem lhes dar autonomia e capacidade de decisão. Depois queixa-se que eles interrompem constantemente o seu trabalho e não fazem o deles.

O António chega atrasado às reuniões da equipa, fazendo perder à empresa oito vezes quinze minutos de trabalho vezes o salário de cada um dos presentes em cada reunião. E justifica isso com a cultura local.

Porque não coopera com pessoas de outros departamentos, o António não as avisa quando antecipa que vão errar. Mas não faz mal porque elas lhe pagam na mesma moeda.

Qualquer feedback negativo sobre o seu trabalho é tido pelo António como um ataque pessoal, pelo que nunca recebe informação útil sobre a sua performance. Acha-se o melhor, apesar de ser medíocre.

Há tarefas que o António considera desagradáveis, pelo que as adia até mais não, gastando tempo em coisas que gosta de fazer mas que outros fariam melhor ou mais barato.

O António “não acredita” no planeamento e por isso não organiza os projectos por si coordenados. Para satisfazer esse capricho toda a gente desperdiça tempo, energia e recursos a produzir em cima do prazo.

Se no trabalho do António não há objectivos claros, processos bem definidos, critérios de tomada de decisão racionais e partilhados, formas de avaliação rigorosas e competência técnica exemplar, a baixa produtividade é apenas o resultado da falta de qualidade do António e do sítio onde ele trabalha. E quem não os conhece que atire a primeira pedra.

 

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