In Executive Digest
Os números são esmagadores: Portugal é um dos países da OCDE com menor taxa de escolarização universitária, com maior taxa de licenciados desempregados e com menor investimento em formação profissional por parte das empresas. É uma conjugação suicidária para um país que precisa de aumentar a sua competitividade.
Há, no entanto, um paradoxo interessante neste tema. O gestor português típico, que não acredita em formação comportamental, é o mesmo que quando os colaboradores não produzem o suficiente compra formação para os “motivar”.
A formação comportamental é como as bruxas. Ninguém acredita nos seus resultados, mas em caso de desespero mesmo os mais renitentes lá vão parar.
O problema é que se pede dela um conjunto de coisas que não pode dar. Espera-se que, por participarem num curso, os colaboradores da empresa: se motivem para enfrentar injustiças; mudem a mentalidade provocada por leis laborais viciosas; se responsabilizem por coisas que os seus chefes não os autorizam a fazer; transformem a cultura da empresa de retrógrada em competitiva; sejam bons profissionais quando os sistemas de avaliação e remuneração não os distinguem; dêem ideias que a seguir os chefes venderão como deles aos chefes deles; tomem iniciativas que serão aniquiladas como ameaçadoras; fomentem mudanças que ninguém parece saber em que visão ou estratégia se inserem; avaliem melhor o “clima” da empresa; acalmem os ânimos exaltados; entre outras magias de índole variada.
Tudo isto sem que os responsáveis das empresas participem, ou alinhem o seu comportamento.
Quanto muito, se for de qualidade sólida, a formação permite desenvolver as habilidades e conhecimentos dos formandos em áreas específicas, e fornecer modelos mentais para melhor entender a realidade; o que pode contribuir para mudanças significativas de atitude e comportamento. O que fazem com isso a seguir é com eles, com os seus chefes e com os sistemas de desenvolvimento das respectivas empresas; não tem nada a ver com a formação em si.
Pedir da formação comportamental o que apenas a linha hierárquica da empresa pode – e deve – dar é uma grave forma de desresponsabilização.
Quem deve gerir a mudança? Quem deve trabalhar as percepções e atitudes dos colaboradores da empresa? Quem deve cuidar da motivação dos membros das equipas para que não esmoreça? Quem deve implementar sistemas para avaliar o comportamento e recompensar o desempenho? Quem deve dar o exemplo de produtividade e empenhamento? Quem deve fomentar o desenvolvimento das competências técnicas das equipas para que se tornem cada vez mais eficazes?
A maioria dos problemas empresariais é de responsabilização. Resolvê-los exige que quem gere pessoas seja capaz de assumir a responsabilidade e dar o exemplo pelas acções que implementam a estratégia desenhada, antes de exigir o mesmo aos demais.
Se não houver sistemas legais, remuneratórios, avaliativos, morais, que promovam a responsabilização dos gestores pelas decisões tomadas, não obteremos melhores decisões e acções simplesmente formando pessoas. No momento de agir continuarão a fazê-lo como sempre fizeram, porque isso é sancionado positivamente.
Só com planos de desenvolvimento estratégicos se pode garantir o retorno do investimento. Planos que garantam que quem gere pessoas se responsabiliza pelos resultados da formação dada aos seus colaboradores; que especifiquem as competências de gestão de pessoas que a empresa vai avaliar e recompensar; que avaliem o resultado alcançado e responsabilizem todos os intervenientes.
Mas aí já não estamos a falar de formação profissional e sim de responsabilização, tema em que ainda não passamos de amadores.