A longevidade média das empresas está a diminuir. As empresas listadas em bolsa antes de 1970 tinham 92% de hipótese de sobreviver aos cinco anos seguintes, enquanto as empresas listadas entre 2000 e 2009 tinham apenas 63%. O sucesso no longo prazo é cada vez mais difícil, muito por causa de um mercado cada vez mais global, competitivo e hostil. A questão central é: porque é que algumas empresas duram mais tempo do que outras?
Ciclos de vida das empresas
Para entendê-lo, precisamos de analisar o ciclo de desenvolvimento dos seres vivos. Tudo o que existe tem um ciclo de vida: nasce, desenvolve-se e cresce, estagna, declina e morre. Isto não se aplica apenas a si e a mim, mas também a produtos e aos resultados das empresas ao longo do tempo. Esta curva pode ser mais ou menos pronunciada, mais ou menos estendida no tempo. No entanto, se não fizermos nada para inovar continuamente em produtos, serviços, processos ou modelo de negócio, em algum momento os resultados da nossa empresa irão estagnar, decrescer e levar ao seu desaparecimento. Parar é morrer aos poucos.
Quando uma empresa inicia a sua atividade e os primeiros resultados aparecem, a equipa sente alegria, entusiasmo e orgulho pelo seu trabalho. As pessoas dão o seu melhor e as coisas correm bem. À medida que a empresa se torna sustentável, acontece uma coisa interessante: o orgulho legítimo transforma-se aos poucos em complacência. As pessoas começam a sentir que têm “o direito” a resultados continuados pela sua qualidade e pelo esforço realizado no passado.
Ao princípio mal se nota, mas isto baseia-se num pensamento do tipo “como o que fizemos no passado deu certo, tudo o que fazemos está certo”. Na realidade não existe nenhuma ligação entre as duas orações desta frase. É apenas uma ilusão na qual cada vez mais pessoas dentro da empresa acreditam. E quando se torna uma alucinação coletiva, é impossível dizer a quem quer que seja: “há maneiras melhores de gerir pessoas, processos e recursos”; ou perguntar: “e se experimentássemos fazer de outra maneira?”, ou “que produto, serviço ou tecnologia pode destruir-nos?”
A onda de optimismo irrealista gera uma sensação de imortalidade que leva a descartar qualquer desafio, ideia nova, pensamento disruptivo, crítica construtiva, como produto dos “velhos do Restelo” que não acreditam na grandiosidade do projeto. A necessidade de mudar continuamente o que fazemos não existe. Afinal estamos na melhor empresa do mundo, os resultados provam-no, para quê mudar?
Como qualquer modelo de negócio tem os seus limites, manter o business as usual leva à estagnação e declínio progressivo. Mas a cegueira coletiva pré-existente faz com que a resposta das equipas ao declínio de resultados seja, na maioria das vezes: “Isto é temporário, vamos esperar pacientemente que os bons velhos tempos voltem. Afinal, tudo o que fazemos está certo, não?”
Claro que a eficácia desta estratégia não é confiável e os resultados continuam a decrescer até um ponto em que se torna impossível ignorá-lo. Mas o que a maioria das empresas faz nessa situação é interessante. Entram no jogo da culpa, nomeiam um ou vários bodes expiatórios e despedem-nos. Isto, por si, não só não resolve o problema como o piora, e os resultados continuam a decrescer. Como consequência, a crise torna-se inevitável e agora a maioria das pessoas já conclui que a mudança é necessária.
O momento ideal para implementar a mudança é quando a empresa tem um desempenho de topo. Aqui, os resultados financeiros e a energia das pessoas são elevados. É mais fácil lidar com a mudança e absorver o seu impacto porque as perdas são proporcionalmente menos significativas.
Reinvenção ou morte
Neste ponto, até os céticos começam a entender que o problema não estava em pessoas específicas, mas na cultura de inovação da empresa, que com o tempo rigidificou mentes, comportamentos e processos.
Quando implementamos mudanças numa empresa, temos de considerar algumas perdas de eficiência no curto-prazo. Por outras palavras, não mudamos processos, sistemas, produtos ou serviços hoje e trabalhamos perfeitamente amanhã. Demora algum tempo até que os benefícios apareçam.
Se começarmos o processo de mudança na fase de declínio de resultados, essa perda inevitável pode matar uma empresa que tenha poucos recursos. Por isso, mesmo nesta fase, muitas empresas ainda resistem à mudança. E acabam por implementá-la só em desespero de causa, em processos de recuperação dramáticos. Se fazer a mudança assim é tão doloroso, porque não mudar antes? Porque antes disso ninguém quer mudar.
O momento ideal para implementar a mudança é quando a empresa tem um desempenho de topo. Aqui, os resultados financeiros e a energia das pessoas são elevados. É mais fácil lidar com a mudança e absorver o seu impacto porque as perdas são proporcionalmente menos significativas. E a motivação da equipa permite-lhe dar o extra de esforço necessário a uma rápida implementação, o que permite reduzir as perdas.
É mais fácil transformar uma boa empresa numa empresa excelente do que recuperar uma empresa medíocre. Uma empresa com bons resultados pode tornar-se ainda melhor, transformando-se através da inovação, para continuar a crescer. Infelizmente, a cultura de complacência gerada quando os resultados são bons impede-o.
Só há duas opções para a disrupção do nosso modelo de negócio: ou é feita por nós, ou é feita pela concorrência. A escolha é simples: temos de ser nós a desenvolver o processo, produto, serviço ou tecnologia que suplante e torne obsoleta a base do nosso sucesso. Temos de ser nós a matar o nosso produto estrela. Temos de ser nós a eliminar a necessidade que os clientes têm do nosso serviço. Temos de nos reinventar. Já. Antes de a concorrência nos obrigar.
Tecnologia: core business ou enabler?
Ninguém tem dúvidas que a tecnologia é o principal motor de disrupção no mundo dos negócios de hoje. No entanto, fala-se de digitalização, de indústria 4.0, de inteligência artificial, impressão 3D, social media marketing, blockchain, como se fossem o centro do negócio, a salvação para tudo o que corre mal na empresa.
A tecnologia não é o modelo de negócio. A tecnologia é um facilitador de modelos de negócio que podem ter muitos formatos diferentes, baseados em ideias diferentes, que requerem pessoas com competências diferentes, que exigem recursos diferentes, para serem bem sucedidos. Um mau modelo de negócio digitalizado é apenas uma empresa que falha mais rapidamente.
Um mau modelo de negócio digitalizado é apenas uma empresa que falha mais rapidamente.
A sustentabilidade de uma empresa depende da cultura de inovação que tiver estabelecido ao longo do tempo. Ter uma cultura de sucesso começa no primeiro momento da empresa. Estabelecer a meritocracia, combater a complacência, lidar com os erros como fonte de aprendizagem, ter chefias que gerem pessoas e controlam resultados, em vez de gerir resultados e controlar pessoas. Tudo isto são pequenos passos no início da empresa e saltos gigantescos quando a cultura errada já está estabelecida.
Liderança disruptiva
A boa gestão da mudança deve começar antes de ser necessário mudar. É feita preventivamente. Mudamos um pouco todos os dias, para evitar mudar muito num dia. Isto exige uma mentalidade de auto-crítica constante. A capacidade de refletir sobre o que fazemos, como fazemos e porque fazemos sem deixar nenhuma pergunta por responder.
A cultura da empresa é o fator mais importante para a mudança e inovação, porque fomenta ou impede a auto-crítica. A cultura de uma empresa é o resultado das práticas que os seus gestores nela têm e permitem. Se queremos que a cultura mude, temos de conseguir que os líderes alterem o que fazem e deixam as suas equipas fazer. A alavanca para estabelecer a cultura desejada é a liderança.
Por muita tecnologia que a inovação traga, o sucesso da mudança depende sempre da capacidade de implementação das equipas. E as pessoas não conseguem implementar coisas que não sabem, não querem ou não podem. O papel das chefias é ajudar as pessoas a saber, a querer e dar-lhes margem para implementar o que a empresa precisa.
Líderes intelectualmente humildes, em aprendizagem constante, são a base da reinvenção da empresa. Um líder seguro de si reconhece que por muito que saiba tem cada vez mais a aprender, e aceita fazê-lo com qualquer pessoa, em qualquer situação. A sua identidade não depende do cargo. O seu poder não é exercido coercivamente. É respeitado pela competência, não pelo título no cartão. Tem um tratamento igualitário, próximo, em relação à equipa. Sabe que ser questionado faz parte das regras do jogo, que explicar-se e explicar as suas decisões é um acto comunicacional importante. Desenvolve pessoas para que sejam melhores que ele.
Não se pode querer inovação que mexa em tudo menos nos nossos interesses: o cargo, as responsabilidades, a autonomia, os benefícios. O impacto total de qualquer processo disruptivo é imprevisível no seu início.
Precisamos de chefias capazes de liderar processos de inovação e mudança sem medo desta incerteza. Que ajudem a empresa a construir uma situação melhor no mercado, mesmo que eles não fiquem nela. Só alguém assim está cem por cento preparado para inspirar outros a realizar transformações pessoais e profissionais que os mantenham a eles e à empresa no topo. Mesmo que seja uma empresa muito diferente. Sobretudo nesse caso.